domingo, 24 de outubro de 2010

Intervenção poética - Adriano Galego Geraldo


"34 com escaras, 1991. Acrílica e bordado sobre voile, 41cm x 31)


                                                      DEIXO                                                       QUERO +
                                                                                                                
                                                           O                                                                  O

                                       EU                                                                                NÃO
                                                      VAZIO                                                        
                                                      ONDE                                                            SE
                                                       ESTÁ                                                             EU
                                                                                                                             VOLTAR
                                                                                        
NÃO SE LUTA                                                                 VOCÊ
COM O VAZIO                                                               TOMA CONTA
NÃO SE PODE                                                                DELE PRA
V E N C E R                                                                                 MIM



(Texto de Adriano Galego Geraldo, inspirado na obra "Da pouca paciência", de Leonilson)
A imagem que ilustra esta postagem é de autoria de Leonilson.


Intervenção poética - Bárbara do Amaral



(Rios de palavras, 1987. Acrílica sobre lona, 196cm x 103)


Emprego cão, piolho,                                        B                                       T
filho, ideia, carteira,
agulha, rim, amante,                                          U                                 U
barata, veia, petróleo,                                       S
o canal, água, abrigo,                                       C                                               D
ajuda, razão, privada,                                       A
pedra, foda, saída,                                            R                                       O
programa, buraco, amor,
chaves, lembrança,espaço                                                    respirar


(Texto de Bárbara do Amaral, inspirado na obra "Da pouca paciência", de Leonilson)
A imagem que ilustra esta postagem é de autoria de Leonilson.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Intervenção poética - Elaine Perli Bombicini


(Jogos perigosos, 1989, acrílica sobre tela, 60cm x 50)




E agora ela sendo parte misteriosa de mim, preciso reaprender tudo
Passo a mão de leve sobre cada objeto ao meu redor, lentamente como se este aprendizado tátil me oferecesse uma vida. Quem diria! aprender a ler com as mãos.
Só posso tocar você agora
Os contornos me mostram e a memória dentro de mim, persegue as imagens que tenho no meu arquivo pessoal, desde minha pequenez
É tão difícil. Mas agora que ela faz parte de mim, minha companheira dentro do meu corpo, úmida, viva e personalizada, penso nas vontades que tive, que tenho
Pois sou humano e só posso tocar você agora
Esse não ver, me faz ter vontades, das que tive, das que imaginei.
Mas ainda tateio, em volta, com paciência cega, quase delicada.
Só posso tocar você agora, apesar da pouca paciência, uma nova aventura.

(Texto de Elaine Perli Bombicini, inspirado na obra "Da pouca paciência", de Leonilson)


A imagem que ilustra esta postagem é de autoria de Leonilson. O texto logo abaixo da figura diz:
"Esses jogos perigosos
não são guerra
nem estão no mar ou no espaço
mas por detrás de óculos
e um par de jeans"

domingo, 17 de outubro de 2010

Carina - Intervenção poética


Dadas a constância  e a liberdade com que Leonilson integrava literatura e imagem, a proposta feita no Ateliê foi um texto breve que dialogasse com a obra. Como se nos vazios deixados pelo artista pudéssemos desenhar palavras que, se descoladas da obra, teriam vida própria como um texto breve.

Chamamos a isso intervenção poética. Esta foi feita pela Carina Freitas. Ao clicar sobre a imagem, ela se amplia.

Abaixo o texto:

Cada ausência é sentida como se meus dentes fossem arrancados com as mãos.
Não há como restabelecer a ordem,
como curar feridas.
Não há tempo, não há vontade, não há.
O tempo
sangra
fecha
cura
passa
volta
Não exijo mais de mim.
Deixo como está. 

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Da pouca paciência



Sem paciência para recortar a lona - ou para remendá-la. Relação com o tempo: não há tempo a perder.
Como acontece com um cobertor pequeno, que cobre os pés ou cobre a cabeça, não houve tecido suficiente pra remendar todos os buracos.
Sem paciência para recortar com tesoura, no capricho, eu rasgo. Pressa, rapidez. Faca? Estilete? O formato, o todo, lembra um revólver.
Os buracos parecem brancos filtros de cigarro.
A presença dos fios denuncia o não-acabado. Um corte que não é exato: é mais urgente. O gesto importa mais que o efeito, o corte.
Pedaços retirados, pedaços colocados. O grande vazio à esquerda se repartiu e cobre possíveis ex-buracos do conjunto.
Ou são dobras - como janelas abertas. Corações malogrados. O grande vazio chama mais atenção que os pequenos?
As palavras estão a lápis. Provisório? Esboço? Pensamento?
Lona amarela. Lona de caminhoneiro. Amarela na frente e no verso. Tampa o destampado.

(Algumas de nossas leituras da obra, que darão norte para as propostas de escrita)

sábado, 2 de outubro de 2010

Porque Leonilson



Nossa proposta é desenvolver uma escrita que nasça da interlocução com imagens. Poderia ser qualquer estímulo. De tudo pode nascer uma impressão, uma ideia, um texto. No entanto, optamos pelo estímulo que parte do contato com a arte contemporânea, sua interpretação, “deglutição”, apropriação e consequente recriação. Desta vez numa outra tela, a do micro, num outro papel, o pautado. Novos pontos, linhas, planos, formas, tons traçados com palavras. Palavras no presente, do presente, para o presente.

Da infinidade de nomes possíveis para esta interlocução, um delimitador importante foi a questão da nacionalidade. Refletir sobre o tratamento dado pelos artistas brasileiros à temática contemporânea nos pareceu mais apropriado a um projeto que pretende estimular a descoberta do caminho da escrita de cada participante.

E no Brasil, que nome escolher? Felizmente são tantos e tão significativos.
Depois de muita pesquisa nossa escolha recaiu sobre Leonilson (José Leonilson Bezerra Dias – Ceará, 1957 – São Paulo, 1993), de carreira breve, porém suficiente para deixar marcado um estilo e uma visão de mundo. Em sua obra pulsa o permanente diálogo com o presente histórico, social, cultural, que ele filtra de maneira crítica e poética.





Leonilson foi escolhido também devido ao perfil do nosso ateliê.
Ele fez parte da chamada “Geração 80” das artes plásticas brasileiras. Em nosso grupo, diversos participantes tem pesquisas realizadas sobre esse período.

Trabalhamos, inicialmente, textos em pequenos formatos. Boa parte da obra de Leonilson foi realizada em tamanho reduzido. Síntese, concisão, precisão, objetividade.

Aspiramos a palavra que nasce da imagem, ele trabalhou como poucos a convivência entre as duas.

A utilização de conteúdos autobiográficos tem permeado nossas discussões em sala, e foram amplamente usados pelo artista em sua obra.

Outro tema discutido no ateliê é a apropriação - Leonilson volta e meia se apropriava de referências alheias, textuais ou imagéticas. Juntamente com as seriações e repetições, recorrentes em seus trabalhos, estes são elementos constantes na escrita contemporânea.

Nossas atividades com os "grudados" (protocolos visuais) lembram muitas vezes, as propostas do artista.

Cadernos de anotações ou mesmo cadernos artísticos também são práticas de alguns componentes do grupo.

Sua revisão do trabalho artesanal, da costura, do bordado, das aplicações, das colagens tem também uma forte relação com a manipulação da palavra, seu trabalho compositivo.


(Voilà mon coeur - frente e verso)

Há muitos outros motivos para esta escolha. Mas é preciso deixar que cada um descubra os seus próprios, a partir do contato com a crítica, a vida e a obra do artista, e com seu tempo – que também é o nosso.

(Adélia Nicolete)